Vejo formas de rostos nas paredes descascadas,
nas falhas dos chapiscos de muros incompletos,
nos vestígios furta-cores das demãos do passado
e na sujeira da vida impressa na tinta asséptica.
Ouço vozes e desconheço de onde elas partem
e nem sei se de fato partem; se estas ocas audições
(que se tornam tensas diante destes misteriosos apartes)
são recados imaginados ou gemidos dos meus porões.
Degusto o vento; quero-o, anseio-o a cada intervalo,
seja feito brisa morna que amacia a cama do dia,
seja feito lâmina gélida que deita a saudade e fatia
o abismo em degraus e a morte em desejo adiado.
Exalam invasoras ao redor das minhas narinas
o chorume e a fragrância bandida das esquinas,
uma a uma, olor a olor, nota crua a crua nota
que passam ligeiras, enquanto a alma se transporta.
Pego o verso somente quando o caço feito a um rato
e ele morde, me lança em chamas, não quer ser escravo
e concreto armado de fogo natimorto: algo fracassado
que já partiu no ocaso, mas deixou seu anzol armado.
O poeta tem inexatos treze pedaços soltos na curva:
cinco sentidos, sete pecados e um poema em fuga.
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